Processos e mortes

Disputa por terra que pode ter provocado morte de promotor já foi motivo de violência

Do NE10
Do NE10
Publicado em 16/10/2013 às 13:08

A disputa pelas terras da Fazenda Nova, em Águas Belas, no Agreste pernambucano, é o principal motivo do conflito entre as famílias da noiva do promotor Thiago Faria Soares, executado nessa segunda-feira (14), e do homem apontado como mandante do crime, o fazendeiro José Maria Pedro Rosendo Barbosa. A briga pela fazenda, além de ser a principal linha de investigação do assassinato do promotor, já motivou outras tentativas de homicídio e processos, segundo a Secretaria de Defesa Social (SDS) de Pernambuco.

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O principal suspeito, José Maria, ainda é procurado pela polícia. Quem tiver informações pode ligar para o Disque-Denúncia: (81) 3421.9595 (Foto: Amanda Miranda/NE10)

A confusão entre as duas famílias já dura quase uma década, tempo em que o pai de Mysheva Freire Ferrão Martins, a noiva do promotor, disputou os 25 hectares mais produtivos do total de 2 mil da Fazenda Nova com a esposa de José Maria. A terra é de uma herança dos dois. Ao longo dos anos, a briga rendeu 16 processos e o sogro de Thiago Faria até é acusado de tentar matar o fazendeiro.

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No entanto, para a polícia, o que provocou a raiva de José Maria foi o fato de Mysheva arrematar, há cerca de um ano, por R$ 100 mil, os 25 hectares em leilão realizado devido a dívidas trabalhistas. José Maria foi obrigado judicialmente a deixar a terra em junho deste ano. 'Com raiva, ele deixou tudo destruído, tirando até os canos que Mysheva instalou', afirmou o chefe da Polícia Civil, Osvaldo Morais. O secretário de Defesa Social, Wilson Damázio, explicou que essa parte da fazenda abriga uma mina de água que rendia ao fazendeiro pelo menos R$ 1,5 milhão por ano, principalmente em períodos de seca, em que abastecia carros-pipa. José Maria teria expulsado a família de Mysheva da terra.

Os processos já existentes contra o suspeito de ser mandante do crime e a sua fama de ser um homem violento foram uma das razões que levaram a polícia a procurá-lo. Não há informações de que o fazendeiro já tenha sido condenado, porém ele é acusado de pelo menos três homicídios, sendo dois de policiais militares. De acordo com Osvaldo Morais, o promotor também provocava a ira do fazendeiro. Além de já ter sido flagrado fotografando o desvio de madeira de uma reserva florestal em Águas Belas, esteve no local no dia da imissão de posse.

O procurador-geral do Estado, Aguinaldo Fenelon, não acredita que a ação do promotor nos processos envolvendo a noiva seja um desvio da sua ética profissional. 'O promotor sempre está envolvido nesse tipo de trabalho. A Polícia Civil investiga e o promotor, como é da sua missão constitucional, denuncia', defendeu também Damázio. Thiago Faria seria transferido para o município de Jupi, também no Agreste.

O CASO E A INVESTIGAÇÃO - O promotor foi assassinado com tiros de espingarda calibre 12 na cabeça e no pescoço, dentro do próprio carro, na rodovia PE-300, na cidade de Itaíba. Ele dirigia o carro em direção ao município, indo para a comarca onde trabalhava, e estava acompanhado da noiva, Mysheva Freire Ferrão Martins, e do tio dela, Adautivo Elias Martins, quando outro automóvel - segundo a noiva, um Corsa prata de placas vermelhas - se aproximou. O carro ainda não foi encontrado pela polícia.

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Thiago Faria estava no cargo há dez meses. Antes, era professor universitário e de cursos preparatórios para concurso (Foto: Reprodução/Facebook)

De acordo com o chefe da Polícia Civil, acredita-se que primeiro foi disparado um tiro de espingarda 12 para que ele parasse o carro. Mais dois atingiram Thiago Faria depois. O carro ficou com marca de tiros de vários calibres. O número de balas que tiraram a vida do promotor só será divulgado com o resultado da perícia. 'Para esclarecer a questão da dinâmica do crime, há a necessidade de esperar as perícias já realizadas e de haver outras', explicou Osvaldo Morais. 'São necessárias mais provas para deixar o inquérito mais robusto e facilitar a condenação dos acusados', acrescentou.

Mysheva teve ferimentos leves, depois de ter pulado para não ser atingida pelos disparos. Adautivo não foi atingido. A noiva do promotor é uma das principais testemunhas visuais do crime. Em depoimento, Mysheva contou que os assassinos tentaram também matá-la, mas não conseguiram. A polícia, ao contrário, diz que a sua vida talvez tenha sido poupada para evitar represália da família Martins, também considerada violenta.

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Na foto, Mysheva é consolada pelo tio que criou o promotor, Paull, durante o velório, realizado no Recife nessa terça (Foto: Amanda Miranda/NE10)

O tio da noiva do promotor, que possui deficiência mental, e outra testemunha, mantida em sigilo por questões de segurança, são tidas como essenciais na investigação. Os três devem participar da reprodução simulada, ainda sem data para acontecer. O corpo de Thiago Faria foi sepultado por volta das 18h dessa terça-feira, no Cemitério Morada da Paz, em Paulista, Grande Recife.

O suspeito de ter feito os disparos contra o promotor, Edmacy Cruz Ubirajá, 43 anos, foi preso na noite dessa terça-feira, em Águas Belas, no Agreste, quando esteve na delegacia para prestar depoimento. Apontado como mandante do crime, o fazendeiro José Maria também está na mira da polícia, que tem um mandado de prisão em nome dele. Ainda será identificado o terceiro suspeito: o motorista do carro que interceptou o veículo que o promotor dirigia. 'Temos trabalhado nesse sentido. Diligências continuam. Esse inquérito tem que estar finalizado até o fim do mês, para que possamos apresentar aos tribunais esses algozes do promotor', afirmou Damázio. O secretário aposta no trabalho conjunto entre as polícias e o Ministério Público.