Déficit

Habitação em Caruaru passa pela falta de moradias e desigualdade social

Ana Maria Miranda Carolina Pinto e Vanessa Pereira
Ana Maria Miranda
Carolina Pinto e Vanessa Pereira
Publicado em 04/04/2019 às 14:40

Pessoas vivem em situação precária na periferia de Caruaru
Foto: reprodução/TV Jornal Interior

De um lado da cidade, prédios altos, casas luxuosas, ruas asfaltadas. Do outro, favelas, barracos construídos em cima da linha do trem, moradores que se arriscam para atravessar de um lado para o outro e esgotos a céu aberto. Estes são os dois cenários vistos em Caruaru, no Agreste de Pernambuco. Quando se olha para os bairros de classe média alta, não se consegue imaginar a atual situação da periferia.

No bairro São José, na Vila São Vicente, as 17 famílias moram em residências doadas por um empresário da cidade. João Batista está desempregado e divide a casa com a esposa e três filhos. Deficiente físico, ele não pode trabalhar em serviços que exijam muito esforço físico e não consegue emprego. Desta forma, a família vive de doações. A situação é precária; eles não tem água, nem energia. "Se não fosse essas casinhas, nós estávamos morando debaixo das pontes", afirmou.

Sem condições de ir para um local digno, famílias se viram como podem
Foto: reprodução/TV Jornal Interior

Antigamente, a vila tinha energia elétrica, mas as contas de R$ 180 ficavam muito caras para os moradores. A água só chega durante quatro dias; os 20 dias seguintes não tem abastecimento. Ismael Tavares tem 53 anos e também tem dificuldade para conseguir emprego. Alguns acabaram fazendo instalações clandestinas para não viver às escuras: "A gente se sente um pouco abandonado da sociedade. Somos um povo esquecido".

A maioria das famílias vive de doações, que são feitas pela Associação dos Moradores. O líder comunitário do bairro São José, Vanderlei Silva, diz que a associação luta para ajudar as comunidades carentes. Em contato com a prefeitura, sempre recebe a resposta de que melhorias no bairro estão no planejamento, mas segundo ele, a data nunca chega. A expectativa deles é que ainda este ano o bairro receba o saneamento da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa).

A Vila Feliz é outra comunidade esquecida pelo poder público. A dona de casa Lucineide Firmino cobra o calçamento da região e iluminação pública. No local também não há saneamento básico. "Eu não posso fazer banheiro, porque não tem como despejar", lamenta. A realidade da comunidade constrasta com o nome. Quando precisa de água, a empregada doméstica Cristiane da Silva, 27, tem que pedir a vizinhos e carregar até a casa dela. A mãe, idosa, fica em uma situação complicada sem as condições básicas. As crianças da vila também vivem pegando doenças. Não há iluminação e o acesso a escolas e postos de saúde também é complicado: "A gente sempre fica triste num canto desse. A gente precisa das coisas e quando a gente vai procurar, não encontra".

Nos últimos oito anos, a população habitacional de Caruaru cresceu. Atualmente, são quase 40 mil pessoas a mais na cidade. O crescimento impacta diretamente na estrutura e andamento de cada município. Sem suporte para atender tanta gente, cresce a quantidade de favelas. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Caruaru tem 40 bairros registrados por lei e 17 favelas, com pessoas morando em barracos, dividindo espaço com até oito pessoas. Já uma pesquisa feita pela prefeitura em 2014 aponta que hoje o déficit habitacional da cidade é de 8 mil imóveis, ou seja, 8 mil famílias não têm onde morar.

Para a especialista em segurança pública e cidadania Elba Ravane, as pessoas que não têm moradia não têm a dignidade assegurada. "A gente não pode pensar no direito à moradia apenas como a casa, e sim toda uma rede de infraestrutura". Ainda segundo ela, a habitação não pode ser pensada como uma mercadoria, e sim um direito social. Tanto as pessoas que podem comprar casas a partir de financiamento como as que não têm R$ 1 para adquirir um imóvel devem ser atendidas pelo poder público.

Para amenizar este déficit, em julho de 2017 foram entregues pela atual gestão 1.488 unidades habitacionais no Residencial Alto do Moura. Em agosto do mesmo ano, 2.404 famílias receberam as chaves dos apartamentos dos residenciais Luiz Bezerra Torres I e II. No total, foram 3.892 famílias beneficiadas. Apesar disto, em menos de dois anos, as residências já apresentaram diversos problemas, inclusive estruturais.

Residenciais Luiz Bezerra Torres I e II apresentaram problemas estruturais
Foto: reprodução/TV Jornal Interior

"A gente tem problema aqui com esgoto, o esgoto agora mesmo está entupido. E falta muita água aqui", reclama a dona de casa Cícera Maria, moradora do Luiz Bezerra Torres. Além disto, alguns apartamentos apresentaram rachaduras. De acordo com a professora Ana Paula Oliveira, a construtora do conjunto habitacional diz que o problema deve ser resolvido junto à Caixa Econômica Federal e alega que já acabou a garantia de um ano. "Disseram que tem que ligar para a Caixa, para a Caixa agendar um dia para a equipe vir", lamentou.

O gerente de projetos habitacionais da prefeitura, Gilmar Pimenta, reforça que uma nova unidade do Minha Casa Minha Vida deverá ser entregue entre julho e agosto deste ano. "No atual momento, as pessoas que estão em condições insalubres de moradia, nós temos o benefício do auxílio aluguel para aquelas pessoas que estão em situação de beira de rio, morando no local que a salubridade é zero, ou foram desapropriadas ou desalojadas", explicou.

No bairro mais populoso da cidade, o Salgado, os problemas não são diferentes. Na comunidade há terrenos irregulares, cheios de pedras, casas em construção, ruas sem asfalto e sem saneamento básico. O analista de recursos humanos Erick Davi se sente inseguro na rua em que mora. "É um perigo muito grande, como nós não temos uma polícia eficaz aqui no bairro, ficamos à mercê de assaltos". De acordo com ele, em uma semana, são mais de três assaltos. A família acaba desistindo de sair de casa para ir à igreja, por exemplo, com medo da insegurança.