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"Não estou mentindo nos atestados de óbitos", desabafa médico do Recife

Profissional de saúde disse que se emocionou ao ouvir idoso dizendo que "foi muito bom viver" antes de ser intubado.

NE10 Interior
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Publicado em 07/04/2021 às 10:30
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"Foi muito bom viver". Esta foi a última frase dita por um paciente idoso, de 75 anos, antes de ser intubado. O médico intensivista Artur Milach, que realizou o procedimento, achava que já havia se emocionado o suficiente em um ano de pandemia, mas com a piora na situação da Covid-19 no país ele vê os pacientes chegando em estado grave ao hospital cada dia mais.

O idoso intubado tinha comorbidades e pediu para falar com a família antes de ser intubado. O médico relatou que ele disse à família que os amava e se preparou para o procedimento. "Quando eu vou intubar um paciente, eu fico perto da cabeça e vou conversando com ele. Nesse momento, ele pegou na minha mão disse: 'Foi muito bom viver, obrigado'. Eu nunca tinha escutado isso, de nenhum paciente. De falar numa serenidade", disse ao UOL.

O médico do Recife disse que se emocionou ao ouvir o paciente. O quadro de saúde dele evoluiu negativamente e, dentro de 24h, ele morreu. "Foi muito duro. Fazia tempo que eu não chorava na pandemia. Esse dia eu chorei bastante quando cheguei no carro. Esse paciente eu levei a semana inteira comigo, isso me fez ressignificar inclusive a minha força pra trabalhar."

Enfrentando a pandemia

Milach está na linha de frente da Covid-19 desde o início da pandemia. No ano passado, se mudou para Recife e atua hoje como coordenador de UTI-covid em dois hospitais da capital pernambucana. O médico comentou que tem observado um crescente número de jovens chegando aos hospitais em estado grave.

"O perfil de paciente jovem que está chegando é muito grave. É isso que está nos assustando. Muito parecido com alguns idosos que chegavam, entravam em insuficiência respiratória, precisavam de um consumo de oxigênio grande até serem intubados", destacou.

Mais de 90% dos leitos de UTI para Covid-19 em Pernambuco estão ocupados, seja na rede pública ou privada. "A gente está pedindo ajuda para vários profissionais médicos até não intensivista que estão vindo ajudar a gente. Só que ter o leito não é a garantia de que você vai ter a melhor assistência e isso preocupa bastante a gente", comentou sobre a alta carga de trabalho enfrentada pelos profissionais.