POLÍTICA

Comandante do Exército ameaçou prender Bolsonaro em reunião em que Garnier aderiu ao golpe

Encontro entre então presidente e cúpula das Forças Armadas foi descrito por Mauro Cid em delação

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Vitória Floro

Publicado em 22/09/2023 às 10:08 | Atualizado em 22/09/2023 às 10:11
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A delação feita pelo tenente-coronel Mauro Cid trouxe à tona uma figura que exemplifica a influência exercida pelo ex-presidente Jair Bolsonaro nas Forças Armadas.

Quando assumiu o comando da Marinha, o almirante Almir Garnier nunca havia liderado uma das duas esquadras da Marinha, a do Rio de Janeiro e a da Bahia. Embora tenha anteriormente comandado o Segundo Distrito Naval em Salvador, nunca havia ocupado o cargo de comandante de uma das esquadras, um pré-requisito informal.

No entanto, sua nomeação ocorreu devido ao apoio do presidente Bolsonaro, mesmo não estando no topo da lista de indicações.

Para demonstrar sua lealdade, Garnier liderou um exercício dos fuzileiros navais em Formosa, Goiás, em 2021. Em 2022, ele se tornou um conselheiro de Bolsonaro, sendo contatado pelo ex-presidente em momentos críticos de seu governo. Garnier havia alcançado uma posição que jamais imaginara.

Portanto, quando Bolsonaro, em uma reunião com os comandantes das três Forças no Palácio do Alvorada, em 24 de novembro, perguntou se estariam alinhados com ele na contestação dos resultados, Garnier foi o único a responder afirmativamente de imediato.

O brigadeiro Carlos Batista, da Aeronáutica, permaneceu em silêncio, enquanto o comandante do Exército, general Freire Gomes, confrontou o presidente.

Ele não apenas afirmou que o Exército não apoiaria um golpe, mas também disse diretamente a Bolsonaro: "Se você continuar com isso, serei obrigado a prendê-lo".

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A resistência ao golpe não se deve apenas à falta de vontade de setores das Forças Armadas, mas também às condições práticas. Freire Gomes sabia que os comandantes das regiões Sul (Fernando Soares), Sudeste (Thomaz Paiva), Leste (André Novaes) e Nordeste (Richard Nunes) não apoiariam um golpe. Além disso, os Estados Unidos - tanto civis quanto militares - já haviam deixado claro que não apoiariam tal ação, com seis comitivas visitando o Brasil ao longo de 2022 com esse propósito.

Um amigo de Garnier, que o encontrou um mês após a reunião mencionada em uma sala da Marinha, o viu desanimado, vestindo roupas civis e desinteressado em participar da cerimônia de transmissão de cargo.

Ele sugeriu que seria melhor para a Marinha, o novo comandante e para si próprio se ele transmitisse o cargo, mas Garnier não aceitou a sugestão.

O amigo comunicou o fato ao ministro da Defesa, José Múcio, que já havia sido escolhido pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, para o cargo.

Múcio tentou convencer Garnier a transmitir o cargo, mas também não obteve sucesso. Os dois se encontraram posteriormente em um almoço na casa do novo comandante da Marinha, Marcos Olsen, já sob o novo governo.

A partir desse ponto, Garnier começou a enfrentar problemas de saúde e pediu a amigos que lhe recomendassem um advogado.

Se as informações fornecidas na delação do coronel Cid forem confirmadas, Garnier poderá enfrentar acusações de pelo menos dois crimes: a promoção da abolição violenta do Estado Democrático de Direito e a tentativa de golpe de Estado. A Justiça Militar poderia até retirar sua patente, e caso perca a titularidade do salário de almirante da reserva, o pagamento seria redirecionado para a conta de sua esposa.

A delação do coronel Cid, apesar de aparentemente focada em Garnier, também lança luz sobre outro almirante quatro estrelas, o almirante Flavio Rocha, que servia como assessor direto do presidente no Palácio do Planalto e ocupou o cargo de titular da Secretaria de Assuntos Estratégicos durante o governo Bolsonaro. Após o fim do governo Bolsonaro, ele foi reintegrado ao Alto Comando da Marinha.

*Com informações do Valor Econômico 

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